Prometo a mim, levar a cabo a inclinação artística que Deus, através da sua e nossa estranha natureza me concedeu. Entre continuar ateu fajuto, “praticar” a Gnose Esquecida (não essa existente por aqui), ser simplesmente um cristão ou cético, como alguns amigos e parentes, este filho da natureza, ainda não se decidiu. Mas, lentamente, a pressão à qual eu gostaria de ser mais imune, vai dobrando meus joelhos.
No entanto, juro pelo sangue e mente que me foram concedidos, que jamais sacrificarei a arte em nome de interesse religioso formal. Se Deus reclamar de minha arte, penso que será ao seu modo, com suas precedências, suas escritas, através de suas melhores assinaturas, abelhas preparando mel, flores e seus mecanismos de sedução, sabores frutais, homens exercendo compaixão..... Em se tratando do Deus, ao qual a rebeldia de minha inteligência concede a possibilidade de Existência, o que ele der estará em livro arbítrio dado. Sendo assim, poderei colocar minha arte a seu serviço... Muitos, isso fizeram, e tal coisa não desqualificou livros, quadros, músicas; como maiores exemplos, alguns cânones religiosos na escrita; hinos como de Haendel na música, quadros com anjos e outras naturezas divinas de Rafael e outros.
E não se perca, então, a arte o seu brilho, enveredando por interesses estranhos à natureza artística brutal de que fala Hölderlin: “Aos mortais convém falar com recato dos deuses. Se, ao luscofusco, uma vez te aparecer uma verdade, numa tripla metamorfose transcreve-a; contudo, sempre inexpressa, tal como é, ó inocente, tal ela deve permanecer”.
Quanto ao Deus a quem consagro uma fé vacilante, a mim nunca pareceu que tivesse contrariedades quanto às peripécias da arte. A arte de que se valeu Ele para tomar os homens foi principalmente a escrita e retórica. Quem duvidar disso que confira e infira. Mesmo os gritos de imprecação de Jeremias pareciam anunciar que teriam vida e vigor na escrita, para que o mundo tomasse a si a loucura de que fala Eliphas Levi. Oh Senhor meu Deus! Objeto de minha confusa fé; minha mente, meu sangue, meus dedos sobre o teclado, minha caneta sobre a folha, minha varredura sobre o mundo e todas as coisas pertencentes a ele, ficarão; para que alguns conheçam o trabalho que parece ter me vindo como algo inaceitável em outro nome que não seja destino...
Escreverei um livro sobre o infeliz papel (compreensão cristã) do personagem Lúcifer. Serão trabalhados dados “históricos”, analisados vários aspectos sobre os personagens e sobre o maior de todos os palcos da imaginação humana. Farei a construção fantasiosa da história do romance para resultar o texto final. Os personagens principais serão: Deus, Jesus, Lúcifer, Miguel, Nexus 36, Belzebu e Eloá. Quando isso é dito, pede-se que o cristão não se ofenda. Ao menos antes de compreender todas as razões, e a principal delas, que moveu a busca pela escrita desse livro.
Não seria tolo ao ponto de me imaginar capaz de subverter uma estranha ordem que perdura como a força do giro dos planetas, segundo a linguagem simplória pela qual explicam exploradores, explorados, homens de bem ou não. Muito menos, seria tolo o suficiente para simplesmente atentar contra a fé cristã dos homens, que já foi capaz das coisas mais belas e mais horríveis de sua própria história.
O que se passa é que desde o princípio, mesmo os homens da Literatura que quiseram fugir do enredo cristão ou religioso geral, de alguma forma, discreta ou direta, muito bem feita ou desastrosa, acabaram por se envolver em tal enredo.
E nossa “tese”, tem como eixo geral o que comumente conhecemos como “O ‘bem’, vence o ‘mal’; o bom vence o mau... Filão explorado desde o princípio da Literatura até o hoje, pois, como é difícil descobrir o que é mal o que é bem, qual é mau e qual é o bom... “A pedra que vos cai na cabeça, certamente é o mal, mas as injúrias e difamações que te fazem, só é mal, se deixas...” Diria Erasmo, em outro contexto...
A história de Deus, de Jesus e a de Lúcifer, mesmo que considerarmos a ausência do revestimento “divino”, nos trazem a todos uma “ansiedade literária”. Quem quiser olhar inicialmente sobre o que se falou agora, busque as obras “Deus” de Jack Miles, “O Guia Literário da Bíblia” de Frank Dermode e Robert Alter, “Jesus e Javé” de H. Bloom e “O Diabo” de Geovanni Papini. Mas isso, só para começar. Pois a maior das vastidões existentes no mundo literário é o trato aos conceitos e reviravoltas sobre bem e mal, que tem como maiores protagonistas de nossos pensamentos os personagens acima.
Sendo assim e por outras razões difíceis ou bastante inúteis de se explicar, iniciamos a escrita do livro “A Obediência de Lúcifer”. Peço a ajuda de meus amigos da turma do Curso de Letras de 2010 e outros especiais, como o Rone, sabendo que em alguns, ela virá fluída no que de melhor há nas relações entre as pessoas. Peço a ajuda de todo professor que eu buscar, com as mais aparentemente patéticas indagações. Peço ajuda, enfim, de todos que pertencem, ao meu ver, ao mais importante dos universos, o universo literário: “O que está escrito, foi falado, e o que é falado, é o mundo dos homens, é ‘os homens” (Jorge, 23.06.2007, baseado em sabe-se lá quantos autores).